Ser não-binárie é não existir. Nem legalmente, nem socialmente.
Praticamente em todos os minutos lembram-me que não existo - até eu me firo dessa maneira, de cada vez que me esqueço de usar adjetivos terminados em "e" ou outra forma de linguagem neutra em relação a mim, ou quando uso mas me sinto meh por "soar mal".
E contudo, se não existo, qual é o ponto de ter objetivos de vida? Quão gratificante é conquistar algo, se esse algo não é meu? Para quê trabalhar por um futuro que nunca será realmente meu? A pessoa que existe é uma farsa e está a roubar o meu futuro. Mentira, ela não tem culpa - a sociedade e o governo é que estão a roubar o meu futuro.
Às vezes gostava de conhecer pouca gente por quem sinto apreço. Assim, não me sentiria prese a elas e podia simplesmente abandonar tudo, com sorte servindo de mártir para a causa trans não-binária, e roubando a minha contribuição para o governo que... eu ia dizer "que me mata", mas é mais irónico que isso: ele não pode ser responsabiliado por matar alguém que não existe. Até do crime se livra.
E embora eu tenha bastantes certezas de que não me vou matar nunca porque sou uma pessoa positiva, até pensar nisso tem o seu quê de tragicómico, pois eu sei que se o fizesse, se o caso passasse nas notícias, provavelmente eu seria referide no feminino. A minha mãe lamentaria ter perdido a filha. Mesmo várias páginas lgbt+ não seriam capazes de usar tratamento neutro.
Pessoas não-binárias nem sequer a morte podem conquistar. Nem isso é nosso...