27 de março de 2021

Às vezes sinto que preciso de ajuda, e não sei como nem a quem pedir.

Nem sei de que tipo de ajuda preciso. Só sei que estou a ver tudo a desmoronar e nem sei porquê. Depressão? PTSD de algum tipo? Eu agora tenho quase 100% de certeza de que tenho ADHD e oooh boy quantas coisas fazem sentido agora, mas nunca me afetou da mesma maneira que agora e portanto penso que tem de haver outra explicação. Há estudos que dizem que ter ADHD pode afetar mais pessoas adultas, mas os estudos explicam isso pelo facto de que pessoas adultas têm mais responsabilidades e portanto os problemas causados por se ter ADHD manifestam-se de forma mais acentuada. Não é o meu caso, tho - mesmo que agora eu esteja finalmente a assumir o papel que sempre soube que teria como a única pessoa a sustentar a casa, eu tenho muito muito mais tempo livre, sem ter de estudar nem nada e continuando com 0 tarefas de casa para fazer. E ainda bem, porque eu não me estou a ver a conseguir ter mais do que uma responsabilidade só. 

(eu pensei em tantas coisas para escrever aqui e já me esqueci de todas)

Eu achei por bastante tempo que era só burnout. Achei isso durante a faculdade, e achei isso até pelo menos um ano depois de a acabar. Agora, isso já não faz sentido. 

Trauma? Eu consigo apontar várias pequenas coisas que possam ter servido como trauma até certo ponto, mas mesmo aquele período em que a minha gata morreu de repente, foi detetado um tumor maligno no útero da minha mãe e a minha irmã fez aquela grande operação ao braço, tudo no espaço de dias enquanto eu lutava para gerir tudo o que tinha de estudar e entregar já que estava no fim do semestre, acabou com tudo bem exceto pela morte da minha gata (e eu já tive tantos animais que estou bastante habituade a animais morrerem). 

Mas mesmo antes disso, no mesmo semestre, eu já estava a avariar - tanto é que eu aproveitava as aulas a que podia faltar para ir andar de fucking patinagem de gelo na câmara de gaia. Eu já estava a tentar escapar... Se eu olhar mais para trás, por outro lado, acho que encontro mais coisas: 

- Eu vivi anos a mentir e dizer que queria ir para medicina porque sabia que era o que os meus pais queriam, especialmente a minha mãe, acima de tudo porque nós nunca tivemos grandes condições financeiras e essas eram as minhas melhores chances - não só vivi então com essa pressão pelas notas, como depois tive de lidar com o actual "coming out" para a minha mãe, que em vez de aceitar imediatamente, tentou convencer-me de que eu devia mesmo assim ir para medicina e só quando eu me recusei a repetir o ano porque precisava de exames melhores para entrar no porto é que ela aceitou; 

- Depois do divórcio, a minha mãe teve de lidar com a desaprovação da família e ainda com um namorado violento mais tarde, mesmo que tenha sido graças ao número de anos que ele cá viveu que nós não acabamos na pobreza antes de eu ter chances de começar a trabalhar; 

- O meu coming out como bi para a minha mãe foi ridículo - ela não percebeu o que eu queria dizer e por isso é que reagiu inicialmente bem, e só dias mais tarde é que percebeu e entrou em negação para além de me culpar por ter tornado essa informação pública porque imensa gente ia achar que eu tinha tendência a trair (eu achei essa impressão horrível mas pensei que era só gente da geração dela que pensaria assim... não muitos meses depois, descubro que ela tinha razão); 

- Quando poucos meses mais tarde faço uma apresentação nas aulas de inglês sobre questões lgbt+, uma coisa voltada para definições e clarificar preconceitos comuns, as pessoas (que ironicamente nem piaram quando eu falei de relacionamentos gays/lésbicos) começaram a questionar/acusar todas as outras identidades, e quando começaram a dizer exatamente o que a minha mãe previu sobre bissexualidade, eu achei que - dada a minha reputação como pessoa que fazia tudo direito e que deveria implicar que eu nunca trairia ninguém - revelar à turma que era bi os iria calar. Em vez disso, levei com uma aula inteira de pessoas a gritar acusações contra mim, e a acrescentar "sem ofensa" a seguir, porque pelos vistos toda aquela gente ainda queria ficar bem na fotografia mesmo depois de inventarem que eu ia metia os cornos a outras pessoas.

(como é que alguém pode continuar a tentar argumentar por uma teoria depois de esta ser confrontada com os factos e falhar? é que o problema nem é a ofensa, é a burrice. é mesmo pena a escola ser obrigatória porque é um desperdício para toda aquela gente que não sabe pensar)

(e ainda antes de tudo isto, até que ponto eu nunca ter tido mts amigos e sempre ter sido viste como uma pessoa diferente por pessoas da minha idade poderá ter algum peso nisto tudo?)

Anyway, eu não acho que tenha ficado muito mal depois de nenhuma dessas coisas. E contudo, agora, eu sinto que o meu coração começa a bater mais depressa só de eu tentar falar em grupos grandes de pessoas - especialmente com assuntos mais sérios ou profundos sobre os quais tenho opiniões fortes, mas às vezes só tentar meter conversa e quebrar o gelo é algo que me deixa mesmo nervose e com vontade de fugir. De facto, eu fujo sempre que posso. Ter pessoas a questionar-me, falar para um público... eram coisas que não só não me causavam problemas, como eu até gostava de o fazer, eu inglês eu aplicaria a palavra thriving a mim nesse tipo de cenários. Agora? Eu sinto-me enjoade só de pensar. 

Eu não tenho energia para conseguir as skills que quero para os meus projetos, eu não consigo cumprir com os meus projetos, e mesmo jogar ou ver animes ou ler nem sempre é possível porque sons tornam-se ruído e nem sempre me consigo focar. Antes, eu acordava religiosamente horas antes da escola para escrever e fazer coisas, passava o dia nas aulas e horas a estudar e ainda conseguia ter outros hobbies. Tenho dores de cabeça, imenso cansaço até físico, e sinto-me doente a um ponto que mal consigo descrever. 

Eu nunca fui muito de chorar. Agora, sinto que estou constantemente on the verge. 

Eu ainda tenho as ideias. Mas não sei como fazer delas objetivos, porque não sei como criar etapas razoáveis para os alcançar quando o que consigo fazer é tão limitado, e tudo se torna frustrante.

Ir a um psicólogo ou médico? Por onde é que eu começava a descrever sequer o problema? E eu sinto que não quero nenhuma ajuda que médicos me possam dar. Eu só queria permissão para escapar. Para deixar o trabalho sem comprometer outras pessoas, e dedicar-me a ficar bem. Isso não vai acontecer enquanto eu trabalhar em coisas que eu não quero. Isso não vai acontecer enquanto eu não puder ser fiel a mim próprie, como uma pessoa não-binária. Isso não vai acontecer enquanto eu não conhecer ninguém mais parecido comigo em termos de interesses, skills, identidades, alguém que possa partihar uma jornada comigo. E isso não vai acontecer enquanto eu não tiver energia, porque sem energia não me consigo fazer socializar. 

É um desgraçado de um loop e eu não sei como o quebrar. Eu queria poder queimar tudo e começar do zero. Eu queria nunca ter ido para ciências, ter tido possibilidades financeiras para fazer escolhas sinceras, poder viver como pessoa não-binária legalmente para que as coisas que eu fizesse fossem associadas mesmo a mim mim, não a uma mulher chamada ana rita. 

Há coisas de que eu gosto no caminho que tomei, desde algumas skills aos meus melhores amigos. Mas podia ter tido skills ainda melhores, e os meus melhores amigos não são o que eu preciso neste momento, e mesmo aquilo de que gostava neles - as conversas pessoas e íntimas - estão a começar a acabar e embora eu não os culpe nem ache que amigos tenham de fazer de psicólogos uns dos outros, sinto que quando mais eu me entendo e assumo, mais me afasto, mais me torno uma anomalia, e menos tenho chances de ser entendide por outras pessoas. 

Isto está tão difícil, e eu não estou a ver chances de melhorar. 

(os rants que escrevo quando me está para vir o perído são ridículos. mas são honestos, e eu não os conseguiria escrever de outro modo, hum?)